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A verdade dos fatos
Grupo de extermínio pode estar por trás de execuções ocorridas em Rio Branco

Nos últimos três anos, a capital acreana, Rio Branco, entrou para o mapa da violência como uma das capitais mais violentas do país. As mais de 500 mortes ocorridas em 2017 deixaram a população aterrorizada e as autoridades da área da segurança pública atordoadas, como se correndo em círculos.

Boa parte dessa violência, que atingiu em cheio o estado do Acre é, segundo os gestores da Segurança, fruto de uma disputa por territórios do tráfico de drogas por pelo menos três facções criminosas: uma carioca, o Comando Vermelho (CV), outra paulista, o Primeiro Comando da Capital (PCC), e por último, considerada a mais violenta entre as três organizações, a facção acreana Bonde dos 13 (B13).

Foram centenas de execuções, algumas com requintes de crueldade extrema, como decapitações e esquartejamentos.

Mas o que os gestores da segurança tentam a todo custo esconder, pelo menos até o momento, é que existem indícios de que a maioria das mortes ocorridas em Rio Branco podem estar sendo praticada por um grupo de pessoas que estariam agindo em forma de milícia, principalmente na execução de membros das facções. O surgimento do novo grupo de extermínio vem sendo tratado sob o mais absoluto sigilo pelo staff da Segurança Pública, assim como foi na época do surgimento dos primeiros indícios de ações dos grupos criminosos organizados, como por exemplo as explosões de caixas eletrônicos.

Grupo de extermínio pode ter voltado a atuar no Acre

Durante meses a reportagem da Folha do Acre procurou levantar informações sobre a veracidade das denúncias, ouvindo de maneira velada policiais da ativa e da reserva, líderes comunitários e moradores das regiões mais atingidas pelo aumento da violência, desencadeado por uma sangrenta disputa pelo controle do tráfico de drogas. A reportagem ainda tentou ouvir autoridades policiais da Segurança Pública e Ministério Público sobre a ação de uma possível milícia, que supostamente teria a participação de alguns agentes públicos.

A reportagem será publicada pela Folha do Acre em duas partes. A primeira fala sobre a denúncia de pequenos comerciantes que estão sendo obrigados a pagar uma taxa imposta pelos criminosos para não serem alvos de roubos e furtos. Os casos da cobrança de taxas estão ocorrendo nos bairros da região da Baixada da Sobral e do Segundo Distrito da capital, Rio Branco.

Na segunda parte, a reportagem fala sobre a suspeita de envolvimento de agentes públicos na cooperação com criminosos e o que dizem as autoridades do Estado.

Carlos Kimpara

Recentemente em coletiva na Casa Civil, o comando da Polícia Militar do Acre revelou que policiais estariam sendo alvos de investigação por parte da Corregedoria da Polícia Militar, mas, depois que as declarações do comandante, Marcos Kimpara, foram publicadas, o alto comando negou que militares estariam sob investigação.

A reportagem da Folha do Acre entrou em contato com Kimpara que afirmou que não chegou ao Comando da polícia qualquer tipo de denúncia sobre participação de milícias no estado.

“Desconheço qualquer forma de milícia dentro da Polícia Militar do Acre e se houver denúncias que sejam direcionadas à Corregedoria da PM que iremos apurar os fatos”, disse.

Folha do Acre também tentou contato com a Polícia Civil e Secretaria de Segurança, além de Ministério Público do Acre para falar sobre as denúncias recebidas, mas a até a data da publicação da primeira parte reportagem nenhuma das instituições decidiu falar sobre o assunto.

Por prezar pelo bom jornalismo em ouvir todas as partes envolvidas/citadas, a Folha do Acre desde já deixa o espaço aberto a instituições públicas acima citadas.

Centenas de jovens que seriam integrantes de facções foram executados no estado

Crime impõe a lei do silêncio e cobrança de “taxa de segurança”

As primeiras denúncias sobre as ações de grupos criminosos em forma de milícia chegaram ao conhecimento da reportagem há quase um ano, e neste intervalo várias pessoas foram ouvidas, e todas elas fizeram apenas uma exigência, o anonimato, o resguardo de suas identidades. O motivo é obvio, o medo de ser a próxima vítima de bandidos que impõe a lei do silêncio nas comunidades mais carentes da capital acreana, e no caso dos policiais, medo de punições administrativas. Moradores e comerciantes evitam conversar abertamente sobre a violência nas localidades.

Na região da Baixada da Sobral, estão concentrados o maior número de bairros de Rio Branco, cerca de 17, e é em meio aos mais de 90 mil moradores dessa regional que as três maiores facções existentes no estado atuam e guerreiam. Ao longo dos três últimos anos dezenas de mortes foram contabilizadas, resultado da guerra do tráfico.

Ainda na região da Baixada, pequenos e médios comerciantes são “convidados” a pagar uma “pequena contribuição” por melhores condições de segurança nos bairros. Segurança essa que é oferecida pelos próprios criminosos instalados nas localidades. Quem não adere ao pagamento da “contribuição” está fadado a amargar prejuízos, que vão de furtos e roubos, até mesmo a morte.

“Eles (criminosos) tomaram de conta do bairro e não temos escolha, temos que pagar e obedecer a ordem deles. Eu pago cerca de R$ 50,00 todo mês, é o que posso pagar, mas a situação é muito difícil, vivemos todo tempo com medo”, confidenciou um pequeno comerciante de 58 anos, morador do bairro Airton Sena, um dos mais violentos na região da Baixada.

Comércio na Baixada da Sobral já foi assaltado 14 vezes

Na Baixada, é onde está localizado o 3º Batalhão da Polícia Militar (3º BPM), mas apenas 70 militares, entre oficiais e praças, são responsáveis pela segurança preventiva e ostensiva de toda a área, o que é humanamente impossível se obter resultados minimamente satisfatórios.

“Essa é uma das regiões mais populosas do estado do Acre, são cerca de 90 mil moradores em 17 bairros e apenas 70 policiais. É um esforço sobre-humano. Não tem como oferecer o mínimo de segurança a população da Baixada com uma situação dessa. Quando acontece um roubo, um homicídio, ou outro crime não se encontra testemunhas ou alguém que possa nortear a ação da polícia para a elucidação dos casos, pois todos têm medo de falar alguma coisa. Aqui todos correm perigo, policiais e moradores, a qualquer momento podemos ser alvo de uma emboscada”, desabafou um dos policiais lotado no 3º BPM.

“Aqui existem becos e ruas que são verdadeiros labirintos e funcionam como rota de fuga para ladrões e traficantes de drogas”, apontou uma moradora do bairro Bahia Nova que não quis se identificar com medo de sofrer represálias dos bandidos. “Aqui não dá para falar muito, principalmente com a imprensa ou a polícia. A essa hora já devem estar de olho em mim, conversando com você”, disse, enquanto entrava apressada em casa.

Relatos semelhantes foram feitos por pequenos comerciantes da região do Segundo Distrito, sobretudo dos bairros Taquari, Santa Inês e Recanto dos Buritis, além de Belo Jardim e Cidade do Povo, esses com o maior índice de crimes atribuídos aos membros das facções.